quarta-feira, 27 de junho de 2012

Escova



Escolheram-me dentre tantas outras. Estava enturmada naquele lugar, mas ansiava sair dali, ser útil. Queria mais para minha vida, de modo que me alegrei ao lançar-me no desconhecido carrinho. Poderia finalmente cumprir minha missão! Fui bem acolhida por aquele casal tranqüilo, amoroso e sonhador. Os dois pareciam conectados, felizes com a companhia um do outro. Havia um quê de novidade no ar. Algo fresco, que não sei explicar. Talvez comparável à pasta que me colocaram para facilitar o trabalho.

Naquela noite parti para a ação pela primeira vez. Senti-me tão realizada! Queria experimentar aquela sensação mais vezes! No entanto, os dias foram se acumulando, assim como a poeira em minhas cerdas azuis. Mantinha-me altiva, pronta para colocar os dons a serviço, mas meus préstimos não foram mais requeridos. Acho que ele não estava mais por ali... Pensei: o terei decepcionado? Fiz algo errado?

Via minha amiga cor de rosa pegar no batente 3X ao dia e eu seguia encostada, no período de experiência. Certa vez, a moça fitou-me saudosa e algo triste. Para minha surpresa, ternamente, me pegou para pentear as sobrancelhas. Fiquei feliz quando ela sorriu. Desde então, minha missão tem sido mais leve e estética...terei queimado meu carma?

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Arabian Eyes



Final de tarde, algo cansada estava. Aguardava sem muita vontade o último candidato para entrevistar. Nada da criatura comparecer ou ligar. Ao contrário dos iluminados, pensava na próxima tarefa... Meus olhos baixos apreciando rascunhos de uma poesia improvável. De repente, ele veio em minha direção. Intenso, sombrio, barba de sábio, olhando-me como se quisesse falar. Recebendo o bote, a respiração suspensa, fiquei incrédula com sua audácia invulgar. Quase esbarrando, sem desviar o olhar, passou vigoroso, apenas a tempo de eu perceber que levava na mão uma malha de jovial listrado. Inesperado contraste para aqueles olhos de outra época e lugar, muito distantes dali. A energia daqueles segundos foi possuindo minha essência, embaralhando os pensamentos. Acompanhei seu caminhar, sem vergonha. Tão vital e magnético, neste lugar de zumbis. Quem é você?

domingo, 3 de junho de 2012

Ocupar



Colocando o papo em dia com um amigo chileno, uma palavra se sobressaiu curiosamente na conversação. Ele diz “ocupo” como sinônimo de “uso”. Por exemplo: “no ocupo esta ropa”.

Intrigada com a novidade, pus-me a pensar. Em que medida ocupamos, invadimos do que nos apossamos?  E vice-versa? Como nos ocupamos do que temos/usamos? Lembrei, então, que nas orações, peço para que Deus me use, que tome posse de meu “veículo” para expressar-Se. Assim, ocupar e usar convergem em sentido, também no português. Ocupe-me, Deus! Pode vir! Arrefecido o entusiasmo, reflito: quanto de mim está vazio para que Ele possa ocupar?

Goji Berry


Goji Berry

Mais uma indicação com tom de panacéia, que os meios alternativos não se cansam de descobrir. Frutinha seca, parecida a uva passa, de um vermelho vibrante quase artificial, lembrando o molho dos rolinhos primavera. Sim, tudo a ver com a China, esse vermelho também. Em se tratando de uma indicação da Cíntia, depositária e generosa partilhadora de milenares saberes, acolhi com o usual otimismo sagitariano. Equilibradora das funções hepáticas e renais e rejuvenecedora, a frutinha é conhecida como berry do sorriso ou happy berry.

Os cereais matinais receberam uma companheira vivaz enquanto os dissabores cotidianos se alistavam: gastos imprevistos, falta de pagamento, decepções e frustrações sucedendo-se sem cessar. Percebi, então, que passei a acolhê-los com inédita serenidade e confiança. Um novo estado tomando conta do meu humor algo ciclotímico. Conclui não saber se a nova atitude se deve ao cansaço ou a elevação de fato. Estaria meu Ser observando aquele teatro dizendo “tsk, tsk...que besteira! Isto não tem a menor importância!”, enquanto o ego se desgasta em bravatas tratando de resistir à vida?

Será efeito da frutinha feliz ou um território virgem que exploro? Será a mudança do DNA? Não me reconheço e rio.